La naturaleza no nos odia

Rui Zink

(Lisboa, 1971). Entre sus títulos más recientes se encuentra Le Terroriste joyeux, con traducción al francés de Maira Muchnik (Agullo, 2019).

La naturaleza no nos odia
El odio es humano
La naturaleza no nos ama
Para eso tendríamos que ser amables 
La naturaleza no nos quiere 
Para eso era necesario perderse algo

La naturaleza no nos mira, mirar no es ver,
La naturaleza no es dios, eso sería perder cualidades.
La naturaleza no nos escucha, ¿cómo, si no sabemos hablar?
La naturaleza nos siente, eso es lo que
En el sentido francés del verbo, oler = sentir
Eso sí, sin duda la naturaleza nos siente
Olemos a quemado, olemos a fuego no deseado
Olemos a un futuro aniquilado

La naturaleza tiene una extraña relación con los humanos:
Somos los que nos hemos alejado, los que nos hemos olvidado,
los que nos hemos descarriado
La naturaleza nos encuentra cómicos, patéticos, divertidos
(Y sobre todo miserables)
La naturaleza nos encuentra la gracia y en ella
(si tuviéramos el coraje, el ingenio, el alma)
Tendríamos todo, amor y gracia, amor y mirada
Calle, avenida, mundo, plaza
Y (si dios y naturaleza lo desean)
Un lugarcito para aparcar.

Versión del portugués del autor.

A natureza não nos odeia

A natureza não nos odeia / O ódio é coisa humana / A natureza não nos ama / Para isso era preciso nós sermos amáveis / A natureza não nos quer / Para isso era preciso sentir falta de algo // A natureza não nos olha — olhar é não ver, / A natureza não é deus — isso seria perder qualidades. / A natureza não nos escuta — como, se não sabemos falar? / A natureza sente-nos, isso sim / No sentido do verbo em francês, sentir o cheiro / A natureza sente-nos, isso sim, sem dúvida / Cheiramos a queimado, cheiramos a fogo indesejado / Cheiramos a futuro aniquilado // A natureza tem uma relação estranha com os humanos: / Somos os que se afastaram, os que se esqueceram, os que se extraviaram / A natureza acha-nos cómicos, patéticos, engraçados / E, sobretudo, desgraçados / A natureza acha-nos graça, e nela / (se para tal tivéssemos ânimo, engenho, alma) / Teríamos tudo, amor e graça, amor e olhar / Rua, avenida, mundo, praça / E (se deus e natureza quiserem) / Um lugar para estacionar.

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