Se es un paño impoluto
menos que blanco,
un huevo crudo inviolado.
En algún lugar la fibra roza en el atizador
—se llena de carbón—
el sello se rompe,
se adquieren arrugas,
agujeros en la piel,
los adornos adquieren pátina.
Mucho se vive del vicio
y mucho del vicio no es sórdido
—solamente rutinario—
lo esporádico tropieza,
el espejo ofusca,
fondos de vasos, gafas ajenas y de carnaval
se salen de foco.
Se quiere «desver » desconocer «desjoder »
desdecir barbaridades balbucientes
en los éxtasis de holograma.
La aurora señala el óbito
con una certitud firmada por mano propia.
ésta ,
colorida por un vitral de la Santa Capilla.
Susurros colectivos vibran en el pabellón de la oreja
se decoloran en el oído con los rumores de las
guerras civiles pessoanas
desde otros rostros locomotores del núcleo de la tierra
que aborrecen.
Lo que importa es lamer la luz refractada,
tornarla ígnea,
arder bajo la bóveda
que en nada recuerda a las altísimas alturas
sino el interior de un casquillo de bala.
*
Cuando el gambusino habla
del cielo, del anélido, del magma,
escupe el gramaje de la palabra,
descarta institutos y ministerios,
los incinera,
hace varias huelgas
—insomnio anorexia apnea licuados,
los engulle.
Alma al descubierto,
se entrega a los que pasan y a los pasos,
tórtolas lechuzas cigüeñas
buitres flamencos y pajarillos
le nidifican en la buhardilla.
Encuentra oro,
lo arroja hacia atrás de la espalda.
Piensa
«una gema es una gota de oro
que el demiurgo nos privó
y ofreció a los pájaros
para que no nos la tragáramos
—ellos olímpicos, en el sarro » .
*
Mis pasos dibujan bandas de Moebius interminables.
Crucé la frontera de los agregados
que repudio.
Uno de ellos puedo ser yo.
Uno de ellos soy yo
en busca de un aislamiento de cacto.
Salgo del confesionario de la piel,
me recargo en los pasajeros del metro
huelo a estantes con libros,
como nubes líquenes champiñones,
lamo desfiladeros y valles arbolados.
Soy una creatura cronológica de las tinieblas
un prunus de probeta infectada
fruto malo de tu útero,
a pesar de tus óvulos y dedos dioses,
de tus cuidados de tejedora.
De tu toque
descubro una huella dactilar.
La inspección sumaria revela
abdomen brazos piernas molidas,
el espejo revela lo mismo
en la nuca, en la espalda, en las nalgas;
la orina, qué gesto.
En la cumbre de la colina
una papisa me recoge el fruto.
lo consagro al suelo y al Útero
pero no me siento maría, más
pobre, un cucú.
*
Eres un mirlo azul ígneo,
mis tímpanos vibran con tus gorjeos
—oigo lo que cantas, no lo que dices.
Me pregunto si preferiría ser magnolia
pesada de hojas y flores gruesas
que tendrías por morada
o un parásito mínimo,
sastre de dobladillos de mielina
que se acurrucara en tu cerebro
y se asomara a la escotilla del ojo
para verte el vuelo.
Saldría después por tu pico en sinfonía
preguntando: «¿quieres que regrese ?»
Y «sí » o «no » serían buenas respuestas
siempre que me mantengas cerca.
Pero es hora de poner punto final a la dieta aérea
y acoger el vacío infinito de Dios
hasta que él forje mar y tierra.
Versión del portugués de Mario Morales
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Tártaro
É –se um pano impoluto / menos que branco, / um ovo cru inviolado. / Algures a fibra roça no atiçador / —acarvoa-se— / o selo quebra-se, / adquirem-se sulcos, / furos na pele, / os adornos ganham verdete. / Muito vive do vício / e muito no vício não é sórdido / —só rotineiro— / o esporádico rasteira, / o espelho ofusca, / fundos de copos, óculos alheios e de carnaval / desfocam. / Quer-se des-ver des-conhecer des-foder / des-dizer barbaridades balbuciadas / nos êxtases hologramáticos. / A aurora assinala o óbito / numa certidão assinada por mão própria, // esta, // colorida por um vitral da Santa Capela. / Sussurros colectivos vibram no pavilhão da orelha / —desmaiam ao ouvido com os rumores das / guerras civis pessoanas / de outros vultos locomotores do núcleo da terra / que aborrecem. // Importa é lamber a luz refractada, // torná-la ígnea, / arder sob a abóbada / que em nada lembra as altíssimas alturas / mas o interior de um cartucho de bala.
*
Quando o garimpeiro diz / do céu, do anelídeo, do magma, / cospe a gramagem da palavra, / descarta institutos e ministérios, / incinera-os, / faz greves várias / —insónia anorexia apneia liquefeitas, / engole-as. / Alma à escâncara, / entrega-se aos passantes e aos passos, / rolas corujas cegonhas / abutres flamingos e chapins / nidificam-lhe o sótão. / Encontra ouro, / lança-o para trás das costas. / Pensa / «Uma gema é uma gota de ouro / de que o demiurgo nos privou / e ofertou aos pássaros / para que a não tragássemos / —eles olímpicos, nós tártaros».
*
Os meus passos desenham nós de Moebius infindos. / Atravessei a fronteira dos agregados / que repudio. / Um deles posso ser eu. / Um deles sou eu / em busca de um isolamento de cacto. // Saio do confessionário da pele, / encosto-me aos passageiros no metropolitano / cheiro estantes com livros, / como nuvens líquenes cogumelos, / lambo desfiladeiros e vales arborizados. / Sou uma criatura cronológica da treva / um prunus de proveta infecta / mau fruto do teu útero, / apesar dos teus óvulos e dedos deuses, / dos teus cuidados de tecedeira. // Do teu toque / descubro uma dedada. / A inspecção sumária revela / abdómen braços pernas maçadas, / o espelho reflecte o mesmo / na nuca, nas costas, nas nádegas; / a urina, que gesto. // No cume da colina / uma papisa recolhe-me o fruto. / Consagro-o ao solo e ao Útero / mas não me sinto maria, mais / pobre, um cuco.
*
És um melro azul –ígneo , / os meus tímpanos vibram com os teus gorjeios / —ouço o que cantas, não o que dizes. // Pergunto-me se preferia ser a magnólia / pesada de folhas e flores gordas / que terias por morada / ou um parasita mínimo, / alfaiate de bainhas de mielina / que se aconchegasse no teu cérebro, / assomasse à escotilha do olho / a ver-te o voo. / Sairia depois pelo teu bico em sinfonia / perguntando «queres que regresse?» / e «sim» ou «não» seriam respostas boas / desde que me mantivesses por perto. // Mas é hora de chegar a termos com a dieta aérea / e acolher o vazio infinito de Deus / até ele forjar mar e terra.