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Nada arde tan deprisa como el papel en el cielo,
donde de las cenizas de una hoja renace una secuoya
y a la sombra de ella, como cornucopias locas,
mil arcángeles andróginos, anfibios y ambidiestros
danzan al son de la savia que otrora fue poema
y ahora es ya aquello que éste deseaba
cuando era un niño de manos ensimismadas
y acariciaba del mundo el pelo hirsuto:
una miel voluptuosa con que endulzar el vino
para revivir la historia, que es tal cual el mito
y que vuela a la deriva rumbo al ocaso,
en camino de la sala más íntima del sueño,
donde somos el carro, la sirena a mirar
y todo nos transporta sin salir del lugar.
*
Transito del balcón al escritorio
o del sol a la sombra, como se quiera
decir, me tiro en la silla, ebrio
de sobriedad, como si cayera
en una piscina sin agua y me predispongo
a la escritura, o a ella me ofrezco, filipino
crucificado en Viernes Santo,
desequilibrado entre la fe y el buen juicio.
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Oscuridad. Un brazo sobre el mundo. Una pierna
trazada, fingiéndose la propia guadaña de la im-
propia muerte. Es esto lo que viene cuando duermo.
Sin embargo —y no pueden ver—, el circo llegó
a la ciudad, con dóciles animales salvajes, disputas
de tubas, manzanas caramelizadas y la hierba se resignó
bajo las patas de un paquidermo casi azul. Nunca,
en la vida real, fui tan feliz, ni debajo de la colcha
que, con cuatro sillas, me convertía en beduino. Ni
flotando sobre la piel que me hizo hombre. Incluso
a la orilla de tu río. La vida no se exalta así, no
se enreda tanto. Éste es el imposible cine del alma,
el futuro pretérito, la rosa que abre en el estómago.
Éste es el merecimiento de los nonatos, el hambre buena.
Y, ahí, mis manos saben esculpir el oro de los
aztecas. Y nunca, nunca, escribieron un poema.
Versiones del portugués de Sergio Ernesto Ríos
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Nada arde tão depressa como o papel no céu, / onde das cinzas de uma folha renasce uma sequoia / e à sombra desta, quais cornucópias loucas, / mil arcanjos andróginos, anfíbios e ambidestros / dançam ao som da seiva que outrora foi poema / e agora é já aquilo que este desejava / quando era uma criança de mãos ensimesmadas / e acariciava do mundo o pelo hirsuto: / um mel voluptuoso com que adoçar o vinho / para reviver a história, que é tal e qual o mito / e que voa à deriva a caminho do ocaso, / a caminho da sala mais íntima do sonho, / onde somos o carro, a sirene e olhar / e tudo nos transporta sem sair do lugar.
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Transito da varanda para o escritório / ou do sol para a sombra, como se queira / dizer, atiro-me para a cadeira, bêbedo / de sobriedade, como se tombasse / numa piscina sem água, e predisponho-me / à escrita, ou a ela me ofereço, filipino / cruxificado em Sexta-feira Santa, / desequilibrado entre a fé e o bom-senso.
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Escuridão. Um braço sobre o mundo. Uma perna / traçada, fingindo-se a própria gadanha da im- / própria morte. É isto que vêem quando durmo. / Contudo — e não o podem ver —, o circo chegou / à cidade, com dóceis animais selvagens, despiques / de tubas, maçãs caramelizadas, e a relva resignou-se / sob as patas de um paquiderme quase azul. Nunca, / na vida real, fui tão feliz, nem debaixo da colcha / que, com quatro cadeiras, me fazia beduíno. Nem / pairando sobre a pele que me fez homem. Sequer / à beira do teu rio. A vida não se exalta assim, não / se envola tanto. Este é o impossível cinema da alma, / o futuro pretérito, a rosa que abre no estômago. / Este é o merecimento dos nascituros, a fome boa. / E, aí, as minhas mãos sabem esculpir o ouro dos / astecas. E nunca, nunca, escreveram um poema.