Tres poemas para Siria / Maria do Rosário Pedreira

 Mote:
Cada vez hay más niños que llegan a Europa solos.

Madre, ojalá que nunca hubiese soltado tu mano:
como el niño al cuello, la calle se hizo más grande
que mi desesperación, se ajó de viejo mi
corazón tan claro. Yo tenía catorce años antes

del estruendo, catorce años y medio antes de tu
grito, quince años cumplidos cuando aparté el
velo de tus cabellos: si me decías siempre que no
fuese lejos, ¿por qué pedían lo contrario
tus ojos detenidos? Aun por encima, madre, llegar

al campo fue como tocar una puerta cansada —
mil tiendas que eran velas remendadas, barcos para
quedarse de nuevo en el camino. Nos trajeron mantas
llenas de preguntas; me tentaron con dulces
para ponerme en el lugar; le cambiaron a mi hermano
el pañal con manos frías. Madre, les dije que

el niño era mío; y ahora, cuando él busca
tus senos en mi cuerpo sin formas, cubro con
tu velo mis cabellos y le canto bajito
canciones de azúcar. No sé qué edad tengo, madre,
pero ojalá que nunca hubiese soltado tu mano.

 

Mote:
Familia de niño sirio que murió en la costa turca huyendo a Canadá; madre y hermano mayor tampoco sobrevivieron al naufragio.

Mi padre me llamó y me pidió que escogiese
un juguete —sólo uno— que me gustara mucho; y
que separase otro juguete para Aylan, que
aún no sabía escoger —pero sólo uno, y tenía que
ser pequeño. Mi padre me explicó que esa noche

iba a meter todo y nada en un atado
ligero; porque así, cuando Aylan y yo cayésemos
de sueño, él y mi madre podían llevarnos al
cuello sin quedarse atrás. Había lágrimas en los ojos

de mi padre cuando contó que, a la mañana siguiente,
tendríamos que dejar nuestra tierra; pero enseguida
se recuperó, diciendo que Kobani ya no era
bueno para nuestra tierra, que nuestra casa era la ruina de

nuestra casa, que todo Siria no pasaba de un tímpano
exhausto de tanto estruendo y dos ojos cansados,
pero tan cansados, de llamas y de sangre. Mi padre

creía que Aylan era demasiado pequeño para
comprender y, por eso, sólo le había dicho que
iríamos a dar un paseo de barco, que pasaríamos
el día en una playa y que, mientras yo y mi madre
nadáramos en el mar hasta quedarnos sin aliento, él

podía simplemente echarse de bruces en la arena,
como tanto le gustaba. Mi padre nunca nos mintió.

 

Mote:
Siria: Bebé y tres niños de la misma familia muertos en un ataque aéreo.

Por ser madres, no serán aquello que
parecía un rayo de sol interrumpiendo el
mundo; y llevan al cuello los niños muertos
al filo de los caminos, confundiendo
siempre la lana de los chales con el calor de
la sangre que ensopa sus manos. Siguen

sin poder creer —o entonces creen
que no serían capaces de amar tanto
una cosa parada en el tiempo, y por eso
van, imperturbables, oyendo latir dentro
del propio pecho los corazones rojos
pequeñísimos. Más adelante, se detendrán

para descubrir un seno redondo y lleno a
la minúscula boca prometido —no vaya ella
a abrirse de pronto y, milagrosamente,
empezar a llorar.

Versiones del portugués de Renato Sandoval Bacigalupo

 

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Mote:
Cada vez há mais crianças a chegar à Europa sozinhas.
Mãe, oxalá eu nunca tivesse largado a tua mão: / com o menino ao colo, fez-se a estrada maior do / que o meu desespero, amarrotou-se de velho meu / coração tão claro. Eu tinha catorze anos antes // do estrondo, catorze anos e meio antes do teu / grito, quinze anos cumpridos quando afastei o / véu dos teus cabelos: se me dizias sempre que não / fosse para longe, porque pediam o contrário os / teus olhos parados? Ainda por cima, mãe, chegar // ao campo foi como bater a uma porta cansada — / mil tendas que eram velas remendadas, barcos para / ficar de novo pelo caminho. Trouxeram-nos mantas / cheias de perguntas; tentaram-me com doces / para me pôr no lugar; mudaram ao meu irmão / a fralda com as mãos frias. Mãe, eu disse-lhes que // o menino era meu; e agora, quando ele procura os / teus seios no meu corpo sem formas, cubro com / o teu véu os meus cabelos e canto-lhe baixinho / canções de açúcar. Não sei que idade tenho, mãe, / mas oxalá eu nunca tivesse largado a tua mão.

Mote:
Família de menino sírio que morreu na costa turca fugia para o Canadá; mãe e irmão mais velho também não sobreviveram ao naufrágio.
O meu pai chamou-me e pediu-me que escolhesse / um brinquedo — só um — de que gostasse muito; e / que separasse outro brinquedo para o Aylan, que / ainda não sabia escolher – mas só um, e tinha de / ser pequeno. O meu pai explicou-me que nessa // noite ia fazer de tudo quase nada numa trouxa / leve; porque assim, quando o Aylan e eu caíssemos / de sono, ele e a minha mãe podiam levar-nos ao / colo sem ficarem para trás. Havia lágrimas nos olhos // do meu pai quando contou que, na manhã seguinte, / teríamos de deixar a nossa terra; mas logo se / recompôs, dizendo que Kobanî também já não era / bem a nossa terra, que a nossa casa era a ruína da // nossa casa, que toda a Síria não passava de um tímpano / exausto de tanto estrondo e dois olhos cansados, / mas tão cansados, de chamas e de sangue. O meu pai // achava que o Aylan era demasiado pequeno para / compreender e, por isso, dissera-lhe apenas que / iríamos dar um passeio de barco, que passaríamos / o dia numa praia e que, enquanto eu e a minha mãe / nadássemos no mar até ficarmos sem fôlego, ele // podia simplesmente deitar-se de bruços na areia, / como tanto gostava. O meu pai nunca nos mentiu.

Mote:
Síria: Bebé e três crianças da mesma família mortos em raide aéreo.
Por serem mães, nem viram aquilo que / parecia um raio de sol interrompendo o / mundo; e levam os meninos mortos ao / colo no fio dos caminhos, confundindo / sempre a lã dos xailes com o calor do / sangue que lhes ensopa as mãos. Seguem // sem poder acreditar — ou então acreditam / que não seriam capazes de amar tanto / uma coisa parada no tempo, e por isso / vão, imperturbáveis, ouvindo bater dentro / do próprio peito os corações vermelhos / pequeníssimos. Mais adiante, deter-se-ão // para descobrir um seio redondo e cheio à / minúscula boca prometido – não vá ela / abrir-se de repente e, milagrosamente, / começar a chorar.

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